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CLUBE DOS CANALHAS



Feliz Ano Novo, canalhas.


Imagem de iStock.


O Clube dos Canalhas fez sua última reunião anual. Embora não faça parte do Clube, sou convidado. Nunca deixo de ir, embora não seja um canalha. Sou membro ad hoc desde que tirei um de seus membros da cadeia, onde foi parar (injustamente) por ter maltratado um cãozinho abandonado. Além disso, foi falsamente acusado de bater em um travesti, destruído o bar e saído sem pagar a conta, mas, como ele me explicou, eram calúnias do traveco. “Dei uns chutes no cãozinho, e só.”


O local escolhido foi o Boulevard do Atlético. Quando soube do local, objetei que alguns membros do clube não eram atleticanos, e muito menos fanáticos. Mas não houve discussão. É o melhor lugar da cidade, segundo eles. Tem bons bares, mulheres bonitas, bons petiscos. Encerrada a discussão. Coxas e paranistas que se explodam.


Lelé, El Loco, ou Lelé Doidão, ou Lelé Fanático, foi o primeiro a chegar. Ele tem um acordo com o chefe da repartição, que o deixa sair mais cedo – o chefe lhe deve alguns favores inconfessáveis e falsifica o ponto eletrônico para ele – e mandou um Zap ao meio-dia anunciando a abertura dos trabalhos (a reunião havia sido marcada para o final da tarde). Ninguém estranhou. Lelé Doidão não economiza álcool.


Logo depois, Gugu Maravilha apareceu. Tinha sido expulso de casa pela mulher, que não gostou ao vê-lo chegar em casa, cedinho, cheirando a álcool e perfume baratos. Os canalhas ficaram furiosos. Com ele, claro. Um canalha com carteirinha deveria ter dado um corretivo na mulher, e jamais teria sido expulso de casa. Sairia por vontade própria.


O Clube dos Canalhas não tem sede própria. Nenhum proprietário que se preze os aceitaria como inquilinos, ou mesmo faria negócios com eles. Eles concordam. Afinal, eles não fariam negócios com quem aceitasse negociar com eles. Assim, as reuniões do clube são feitas em bares. Um bar qualquer é escolhido e passa a ser frequentado, até que os donos os expulsem, por falta de pagamento das contas.


Continuei tomando meu chá de flores de hibisco, mastigando um biscoito amanteigado, enquanto os canalhas bebiam até ficar entorpecidos pela bebida maligna. Certa vez tentei seduzi-los para as vantagens de viver em sobriedade, comer comida vegana, frequentar a igreja e fazer trabalhos voluntários em prol dos povos originários e dos cãezinhos sem lar, mas nenhum deles se interessou. Eles preferem comer carne vermelha, torcer para o Atlético, viver como animais e votar no Bolsonaro.


Todos sentiram a ausência do Peladão. Este ganhou o apelido porque tinha o hábito de tirar a roupa e badalar um sino para atrair as mocinhas, em convescotes patrocinados pelo Estado. Dizem que fazia muito sucesso. Mas ele, fiel às tradições paranistas – o único time popular de Curitiba, o herdeiro do Ferroviário, do Colorado e de outras agremiações fracassadas, o único time que um comunista convicto pode torcer – não iria a território inimigo. Cautela e caldo de galinha não faz mal a ninguém, e Peladão não iria ao Boulevard com uma camiseta do Paraná Clube e uma bandeira vermelha. É canalha mas não é burro.


Depois de mil bazófias (e litros de álcool suspeito) os canalhas resolveram mudar de ares. Foram terminar a noite em uma casa suspeita no Parolin. Eu terminei meu chá de hibiscos e fui para casa, comer umas ervas colhidas pelos povos nativos, com pegada de carbono zero.


Feliz Ano Novo.

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