top of page
Foto do escritorHatsuo Fukuda

NADA MUDOU

Encontros e desencontros da vida.

Imagem de Greg Montani por Pixabay

Uma das locações do filme de Joe Wright, a clássica cena da ruptura entre os protagonistas.

Todas as manhãs, ao olhar pela minha janela de confinado, leio o recado, em letras garrafais, na platibanda do 8.º andar do prédio em frente: “BITO NADA MUDOU”. Embora torça para que o recado tenha sido recebido – e deve ter sido, vistoso como é – e aceito, penso sempre que este é daqueles recados em que o desejo é vencido pela experiência, pois sabemos, há longos anos, e não é preciso ter lido Heráclito (nunca se entra nas mesmas águas do mesmo rio), para saber que tudo mudou. Pois é, Bito e seu amigo ou amiga, tudo mudou, e está mudando, e tudo passa, e tudo passará.


Neste rio no qual nos banhamos, e cujas águas nunca são as mesmas, talvez o que mais atraia a atenção da humanidade é aquele do amigo ou amiga de Bito: o fluxo eterno das relações amorosas entre homens e mulheres entre si. Eternamente em movimento, ora dizendo sim, às vezes não, às vezes talvez, como no bolero, e nas milhões de canções populares e não tão populares em que se canta o esperançoso desejo pela pessoa amada.


Irônico é pensar que uma das escritoras cujo único tema aparente foi o relato dos encontros e desencontros entre homens e mulheres nunca tenha se casado. Refiro-me a Jane Austen, cujos poucos livros ainda hoje inspiram homens e mulheres ainda interessados nas relações amorosas. Embora o tema austeniano aparente seja sempre o dos encontros e desencontros de amor, só um rematado tolo veria desta forma os seus romances. Já me ocorreu que só maiores de cinquenta anos poderiam entendê-la. Prova de seu gênio é que jovens virginais a lêem com o mesmo gosto de leitores encanecidos (e desiludidos). Orgulho e Preconceito, talvez o mais famoso deles, devo ter lido mais de dez vezes. Nunca (nunca) deixo de rir à ironia e leveza com que trata seus personagens.


Seminal e popular como é, Jane Austen recebeu inúmeras filmagens e séries de televisão. A BBC usou inúmeras vezes seus romances em minisséries. Delas, Orgulho e Preconceito, Emma e Razão e Sensibilidade foram publicadas no Brasil, em uma bela caixa. Lembro que o empedernido jornalista Paulo Francis, quando assistiu Orgulho e Preconceito (passou na PBS, nos EUA, na época pré-streaming), disse que no final “chorou como um bezerro desmamado”. Levando-se em conta que o final é mais conhecido que andar para a frente - spoiler: os heróis casam no final – essa revelação mais nos diz da beleza da minissérie do que qualquer outra coisa. Nesta minissérie, Colin Firth foi Mr. Darcy, e Jennifer Ehle é Elizabeth Bennet. Muitos a consideram a filmagem canônica do romance. Os críticos se engalfinham nesta questão, da qual me abstenho.


No cinemão, Joe Wright também filmou Orgulho e Preconceito, desta vez com Keira Knightley no papel de Elizabeth e Matthew Macfadyen como Mr. Darcy. Recebeu quatro indicações para o Oscar, inclusive de melhor atriz para Knightley. Ótimo também é Razão e Sensibilidade, de Ang Lee, com Emma Thompson, Kate Winslet e Hugh Grant. O filme foi indicado a 7 Oscars, inclusive de melhor filme e melhor atriz para Emma Thompson, ganhando o prêmio de melhor roteiro adaptado, que foi para Thompson. Ang Lee é um dos grandes diretores do nosso tempo, com uma paleta espetacular, que só em Hollywood inclui Crouching Tiger, Hidden Dragon, Brokeback Mountain, Life of Pi, tendo sido indicado para nove Oscars, tendo ganhado três, sendo dois de melhor diretor e um de melhor filme estrangeiro. Meu crítico predileto, Roger Ebert, incluiu o filme entre os títulos de “25 Movies to Mend a Broken Heart”, mas isso não serve de recomendação para corações empedernidos.


Outro filme espetacular é o “Clube de Leitura de Jane Austen”, com um grande elenco, todos ótimos, e vou citar apenas Maria Bello e Emily Blunt. Diversão para os austenmaníacos é identificar os personagens do filme com os personagens dos livros de Austen. A influência de Austen se encontra também em “Patricinhas de Beverly Hills”, inspirado em Emma, um filme hoje clássico. Um divertido filme também é “Orgulho e Preconceito Zumbi” (sim, tiveram coragem de fazer isso). Poderia escrever páginas e páginas sobre filmes, refilmagens e peças livremente inspiradas em Austen.


Pensando bem, acho que a amiga ou amigo de Bito tem razão: nada mudou.


Citei muitos filmes. Se você estiver interessado, acesse o Just Watch. Nele você vai encontrar todos eles. Quanto aos livros, estão sempre sendo editados e reeditados; você os encontra nas melhores casas do ramo.

Comments


bottom of page