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POR QUE CELEBRAMOS UM CASAMENTO

O que nos leva à celebração de uma instituição tão incerta?


Imagem de MasterTux por Pixabay

Curitiba, 9 de fevereiro de 2020.


Querido diário:


Hoje, vendo fotos de um casamento, fiquei me indagando por que, afinal, celebramos um casamento. Foquei na foto clássica: casal diante do altar, após a cerimônia, o noivo com traje alugado - como os bonequinhos de bolo - e a noiva, adorável em seu vestido branco, mais maquiada do que necessário, radiante de felicidade.


Então ocorreu-me a crueldade do pensamento. Por que celebrar um casamento, impondo-se despesas altíssimas ( trajes, igreja, arranjos florais, músicos, recepção, banquete e dança ), se é certo que aquele sorriso radiante irá gradualmente sumindo, esvanecendo-se a cada decepção, marcado por rugas de rotina.


Sejamos francos. Em cada dez casamentos, cinco acabam em separação, quatro sobrevivem por conformismo e apenas um, iluminado, concretiza o sonho de uma vida realizada a dois em felicidade. Nos votos clássicos, os noivos prometem solenemente, perante seus familiares e amigos, que serão fiéis, amando-se e respeitando-se até que a morte os separe. São três votos difíceis de cumprir e pelo menos um deles não deveria ser feito.


Claro, é possível ser fiel e para a maioria dos casais ( nem todos são Sartre&Beauvoir ) a fidelidade é um fator importante na estabilidade da vida em comum. Mas a maioria das pessoas não cumpre este voto ao longo dos anos. Basta a rotina cercar o sexo, um agravo para justificar uma aventura, uma briga para levar um dos cônjuges a ceder à tentação que aparece logo ali.


O respeito sequer deveria ser uma promessa, pois não deveria ser necessária. Mas no mundo que vivemos, em que o feminicídio cresce assustadoramente, assim como o machismo ( até há mulheres machistas ), o voto de respeito parece difícil de cumprir, pois é trocado por agressões e gritos. E gritos afastam. Alguém já disse que casais próximos falam baixinho, amantes sussurram delícias no ouvido um do outro. Quanto mais alto se fala, aumenta a distância. Afinal, quem está distante precisa gritar para ser ouvido.


Finalmente, as pessoas jamais deveriam prometer que irão se amar. Ninguém deve prometer algo que não sabe se poderá cumprir. Amar não é escolha, amar não é faculdade que se adquire por exercício. Então, não prometa. Sim, você poderia prometer que irá se esforçar para manter aceso seu amor, cultivá-lo com gentilezas, regá-lo com carinhos e atenção. Mas nada garante. Então não prometa, pois não depende de você. E um belo dia você acorda surpreso e percebe que não ama mais, ou incerto acerca deste amor…


Promessas pela vida inteira, até que a morte os separe. E raramente é a morte que separa - é o egoísmo, a impaciência, a ansiedade, a cobrança. Algumas vezes é a morte, mas provocada por um dos cônjuges. Com certeza, todos sabemos da realidade que cerca o casamento, então por que o celebramos em uma cerimônia tão cara e suntuosa?


Talvez porque, lá no fundo, bem no fundo, somos românticos. Todos casamos para a vida inteira. Não casamos pensando vamos ver no que vai dar. Casamos convictos de que ela/ele é a/o parceira/o amada/o, que nos acompanhará ao longo dos anos, nas muitas tristezas e doenças da vida. Casamos acreditando, de todo coração, que nosso amor é diferente, amor de Vinícius e Montenegro, ainda que em Vinicius alteremos um pouco seus versos: que seja eterno e dure


E se durar uma vida inteira, o que para muitos é eternidade, será mesmo uma benção. Como são abençoados aqueles cujas mãos envelhecem dadas, cobrem-se de rugas sem se largar e celebram todas pequenas alegrias que um casamento oferece.

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