Japão faz fronteira com Polônia. Na Boca Maldita.
Foto de Hatsuo Fukuda
Farofeando pela Curitiba ensolarada de julho, no eterno ofício de desocupado, paro na Boca Maldita, onde encontro o Mazinha, um tanto macambúzio. Sua última tentativa de explicar as razões da desgraça brasileira não estava sendo bem recebida. A turma insiste em tomar os caminhos errados, apesar dos conselhos do sábio e experimentado Mazinha. Sugiro um café, para consolá-lo, mas ele ultimamente só toma café gourmet, e a sugestão foi ignorada. Para salvar a situação, surge um novo integrante na roda, Ulisses Iarochinski, carregado de sacolas de pão. Explicou que havia se abastecido na Padaria A Camponesa (Ótimo pão. Quando tenho dinheiro, devoro um pão d’água com mortadela, de pé no balcão.). Não o conhecia. Desenvolto, como um homem que durante muitos anos trabalhou em uma trupe teatral, onde era um faz-tudo, logo dominou a roda, com histórias jocosas (Sério? Você escreveu mesmo isso? Histórias jocosas? Faz-me rir.).
Polaco, pontificou sorridente, é visto como pejorativo pela própria colônia polaca, mas esta é a palavra correta para o gentílico. Polonês, segundo ele, é galicismo. E desandou a contar suas aventuras com a palavra. Ele escreveu um livro, Saga dos Polacos, e se dedicou a promover seu lançamento, principalmente junto à colônia polonesa, por todos os lugares onde há polacos (ou poloneses. Não vou entrar nessa briga.). Na Sociedade Tadeusz Kosciuszko, no Alto São Francisco, um velho polaco aproximou-se da mesa onde estava o ilustre autor e seus livros. “Aqui não tem polaco” Aqui só tem polonês!” E começou a jogar os livros pela janela. Fim da tarde de autógrafos. Gargalhadas da platéia.
Em outras cidades, o mesmo padrão. Como se vê, o cancelamento que hoje tanto se fala não é novidade. Só assumiu ares tecnológicos. A turma agora mata e esfola pelo celular, sentado confortavelmente em suas poltronas, entre uma gasosa e outra. Antigamente era ao vivo e a cores.
Seduzido pela fala de Ulisses e sua saga de historiador polaco, compro o livro. Lá descubro pérolas que na minha ignorância desconhecia. Você, meu caro leitor (meus 7 leitores), saia da poltrona e compre também. Nunca é tarde para descobrir as razões da nossa curitibanice, que é em boa parte devida à saga polaca nas terras dos pinheirais. Há muita informação e histórias interessantes. Sua aventura existencial é também a nossa.
Descubro que a Colônia Santa Bárbara, em Palmeira, que era vizinha da anarquista Colônia Cecília, foi assim batizada devido a uma tempestade de raios. O dono do boteco na encruzilhada rezou por Santa Bárbara, e nenhuma das vacas que pastavam em frente foi atingida. Foi um sinal para que a comunidade assim a denominasse: Santa Bárbara, que é a protetora dos raios e tempestades (Iansã, nas religiões afro-brasileiras). Ora, a experiência anarquista durou poucos anos, Santa Bábara ainda está lá; talvez se os italianos anarquistas tivessem rezado a Santa Bárbara... mas eles eram ateus.
Saga dos Polacos, de Ulisses Iarochinski. Você encontra o livro na Biblioteca Pública. Para adquiri-lo, somente com o autor. Estou em campanha para que ele a disponibilize na Amazon Books. Vai, Ulisses, levante as velas do navio na Rede. Outros querem conhecer a sua Ítaca.
Um texto simples, descontraído e provocativo! Parabéns amigo Hatsuo!